Abandono animal – uma fotografia onde Portugal fica mal
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Quando o tema é o abandono e os maus-tratos a animais, Portugal fica muito mal na fotografia. Apesar do esforço de muitas pessoas, continuamos a ser um país subdesenvolvido nesta matéria.
De acordo com os dados fornecidos pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), que realizou, através da Universidade de Aveiro, o primeiro Censo Nacional de Animais Errantes, existem, em Portugal Continental, mais de 930 mil animais errantes. Destes, contabilizam-se 830 541 gatos e 101 015 cães.
O número de animais recolhidos pelos centros de recolha oficiais também deve suscitar preocupação. Só no ano passado, foram retirados das ruas mais de 45 mil animais, segundo os dados disponibilizados pelo ICNF. Contudo, sabe-se que este número é inferior ao número real, uma vez que 58 municípios foram incapazes de prestar os dados requeridos pelo ICNF.
Para um país da nossa dimensão, que se pretende desenvolvido e civilizado, este é um número que reflecte uma realidade indigna. A maioria das associações não tem mãos a medir e alberga um número de animais superior aquele que deveria albergar. Existem, também, muitas abrigos ilegais cujas condições são, muitas vezes, deploráveis e onde já se viveram episódios verdadeiramente trágicos – recordem-se os casos de Santo Tirso, em 2020, e de Vila Real de Santo António, em 2021.
Muitos dos bons exemplos estão a Norte
Nos países escandinavos, na Alemanha e na Inglaterra, a situação é incomparável com a nossa. Em todos estes países, o número de cães abandonados é bastante baixo.
Mas o melhor exemplo é mesmo o dos Países Baixos, o primeiro país a alcançar o feito de não ter cães abandonados nas ruas. Para que esta conquista fosse possível, as autoridades holandesas executaram um pacote de medidas altamente eficiente.
Desde logo, impuseram pesadíssimas penalizações e, nos piores casos, penas de prisão para quem infligisse maus-tratos (onde se inclui o abandono) a qualquer animal. Esta legislação foi acompanhada por uma fiscalização apertada relativamente ao cumprimento da lei.
É precisamente esta fiscalização que falta em Portugal. A legislação contra os maus-tratos, que entrou em vigor em 2014, foi um passo importante mas a ausência de uma fiscalização eficaz torna-a quase inconsequente.
Ainda no plano criminal, as autoridades holandesas legislaram para castigar severamente os casos de reincidência relativamente aos maus-tratos. Para além das penas de prisão e das elevadas coimas, os prevaricadores ficam proibidos de ter um animal durante 30 anos.
Contudo, aquela que é considerada uma das políticas mais eficazes para o sucesso alcançado pelos Países Baixos, consubstanciou-se num conjunto organizado de grandes campanhas de vacinação e de esterilização a todos os cães encontrados nas ruas.
Por oposição, em Portugal, assistimos a um subfinanciamento das campanhas de vacinação e de esterilização.
Como em tudo, o conhecimento é essencial
Uma realidade que todos os países com uma baixa taxa de abandono partilham é o tempo e o esforço que os tutores investem a treinar os seus cães. Para isso, contam, muitas vezes, com o apoio de profissionais, designadamente de treinadores.
Estes treinos podem ser individuais ou em grupo. Praticamente todos os tutores de cachorros destes países, participam em aulas específicas para cachorros, garantindo que estes se integram rapidamente à realidade de uma cidade, ou de uma vila. Esta gestão comportamental responsável permite, também, reduzir significativamente o abandono de cães, uma vez que, não raras vezes, a razão que subjaz o abandono prende-se com problemas comportamentais que os tutores são incapazes de gerir.
Seria muito importante que em Portugal houvesse também esta cultura por parte dos tutores. Para além das questões de veterinária e de alimentação, é necessário pensar nas questões que se relacionam com o treino e com a educação dos cães.
Para os que consideram este assunto secundário, vale a pena lembrar as sábias palavras de uma figura histórica e consensual: “A grandeza de uma nação pode ser julgada pela forma em como esta trata os seus animais”. Mahatma Gandhi sabia bem o que dizia, basta ver o reflexo entre os países com um maior Índice de Desenvolvimento Humano e a quase inexistência de animais abandonados e maltratados dentro dos seus territórios.
A haver a ambição de Portugal estar entre as nações mais desenvolvidas do mundo, a temática do abandono animal e dos maus-tratos terá de ser levada a sério.